Meu Ipê

Um simples Ipê Se meu amor me quisesse a vida inteira ela teria bem mais sentido. Tantas as coisas que sonho fazer com ela e nossos futuros filhos, coisas que sem ela não tem razão de ser. Quero logo a nova casa com um bom quintal, e para lá ir sempre que o tempo ficasse muito quente. Queria plantar um ipê para cada filho, neto, um para ela e outro para mim. Seis ou mais ipês, de preferência amarelos, para que quando outubro chegasse eles se tornassem verdadeiras torres douradas visíveis à distância, para que as pessoas lembrassem como são bonitos os Ipês em plena florada e tivessem a chance de assim como eu, sentir o coração aquecido e renovado pela beleza deles. Isto é algo raro em São Paulo. Moro num bairro onde há uam rua com o nome de Ipê que não tem Ipê. Eu os quero por que acho que melhor do que qualquer outra coisa, do que alianças, certidões, ou declarações de amor, eles testificam o que sinto por todos, e o que nutro pela nossa relação. Tronco escuro, de maneira dura e resistente, raízes profundas que se abrem como uma segunda copa no chão sem todavia levantar calçamento. Cresce por baixo de muros, não tem medidas a raiz de um Ipê, tanto que é muito difícil ser derrubado por tempestades e ventanias. Não dá cupim e nem apodrece com facilidade. Sua copa se ergue alta e espalhada, com os galhos inclinados para cima, mas é preciso olhar com cuidado para perceber a suave angulação. Durante boa parte do ano ele é de um verde escuro, de folhas pequenas e abundantes até que ao fim do inverno as folhas caem todas e fica completamente nu. Só que onde dantes haviam folhas nascem flores de um rosa claro puxado para o lilás, ou o mais belo de todos, nascem flores amarelas, pequenas, como pequenos cones que se abrem em pétalas delicadas em cachos densos. Subitamente a árvore se torna visível em meio á mata fechada, como uma árvore feita de ouro. As chuvas não arrancam facilmente as flores, e a florada dura pouco mais de um mês. É a árvore que abençoa os amantes com o amor eterno, diziam os índios, pois ela se renova em paixão todos os anos. Por isso que quando meu amor me pergunta se eu a amaria para sempre eu respondo que sim, mesmo quando eu sou duro e seco, como o ipê antes da florada, pois assim como a arvore meu amor tem uma constância que eu mesmo aparento não ter. Eu amo a todos com a secura carente dos galhos onde as flores estão sendo gestadas, de maneira que o que há ali não é nada feio ou agressivo, mas um processo de renovação, eu a amo quando estou verde e copado, sendo para ela sombra e sustentáculo, madeira dura e resistente na qual ela pode confiar que não é qualquer tempestade que derruba, sou para ela a florada dourada da primavera quando me faço alegria pelo olhar dela, e sou profundo como as raízes encravadas na terra. Queria mesmo é morrer de amor não de dor. Queria ser enterrado, quando a morte assim chegar, de preferência aos pés de algum ipê, sem lápide, sem caixão ou mortalha de maneira que a gente se misturasse no final, como vivemos juntos nossa caminhada na terra. E ainda que tenhamos sido esquecidos pelas gerações seguintes, as pessoas passariam e olhariam os ipês , sem nem prestar atenção a nada e diriam: que belas árvores, ou silenciariam e ficariam maravilhadas e embevecidas com a beleza delas, e assim meu amor duraria para sempre, na sensação gravada no coração de quem nos visse ali, torres douradas desafiando o tempo.


* um feliz ano novo, felizes 365 dias vida!